Comissão de Cultura debate desafios das TVs comunitárias. Foto: Alexandra Martins/Agência Câmara

Por falta de investimento público, as tevês comunitárias se mantêm hoje com doações e trabalho voluntário. Esse é o cenário dos 95 canais existentes no País, segundo Paulo Miranda, presidente da Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCOM). O relato aconteceu durante audiência pública realizada nesta terça-feira (19) pela Comissão de Cultura para debater os desafios da regionalização da produção audiovisual nos canais comunitários. 

Segundo Miranda, a falta de investimento do governo inviabiliza o crescimento das mídias comunitárias, que muitas vezes entram o mês com centavos em suas contas. “Em outubro, a TV comunitária da capital do País tinha 27 centavos na conta. E a gente tinha que pagar salário dos funcionários, impostos, contador”, disse. “TV comunitária é uma emissora que funciona de acordo com a lei. A gente gera emprego e renda e precisa de recursos. Não podemos apenas depender de sindicatos, pessoas físicas e movimentos sociais que doam recurso”, completou.

O descaso dos governos com o setor também foi apontado pelo deputado Stepan Nercessian (PPS/RJ). Para ele, a história de sucesso das televisões está diretamente ligada à qualidade de transmissão, pois “ninguém quer assistir uma TV com chiado ou imagem borrada”. “Se há interessa na TV pública, porque não se investe na qualidade de transmissão?”, questionou o deputado que afirmou ainda que vários setores poderiam ajudar o setor, mas não o fazer por “falta de interesse”.

Propostas

Paulo Miranda apresenta propostas para fortalecimento dos canais comunitários. Foto: Alexandra Martins/Agência Câmara

 

Como alternativa para mudar o atual cenário, as associações ligadas ao setor defendem, por exemplo, a veiculação de publicidade comercial nos canais comunitários e uma nova partilha do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel) que inclua os veículos comunitários. “Hoje, 75% dele vai para a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), 22,5% para as TVs legislativas, e 2,5 para a Anatel. Só que para as mídias alternativas não vem nada. Se viessem 3% seria de muita ajuda. Isso significaria R$ 9 milhões por ano para as TVs comunitárias se nós já estivéssemos incluídos no Fistel”, reforça Miranda.

 

O assunto é tema corrente na Frente Parlamentar de Defesa das TVs Comunitárias, presidida pelo deputado Roberto Santiago. De acordo com ele, a Frente tem trabalhado para liberar os recursos do Fistel - que estavam sendo recolhidos em juízo - e incluir as comunitárias nesse repasse. Para o deputado, o fortalecimento desses canais e a qualidade do conteúdo oferecido aos telespectadores depende também do recebimento de verba pública. 

“O dinheiro público que nós estamos querendo é para a comunidade investir na própria comunidade. Nós estamos querendo que o cidadão enxergue a escola do seu filho, a praça da sua cidade, que conheça os problemas da sua cidade. Portanto é fundamental que tenhamos recursos públicos para que essa realidade se torne efetivamente verdadeira. Devemos continuar com o que se passa no Brasil inteiro nas grandes redes de comunicação, mas temos que fazer o contraponto. E esse contraponto é fundamental para que a gente possa mostrar a realidade de verdade e construir uma sociedade mais igualitária”, destacou.

Na Câmara

Além do fundo, dois projetos de lei que tramitam na Câmara são defendidos pelas associações. O PL 5409/2013, do deputado Ricardo Berzoini (PT/SP), que permite a inclusão de publicidade nas TVs comunitárias por três minutos a cada hora de programação; e o PL 4961/2009, que estabelece o repasse de 10% do total da verba de publicidade dos órgãos públicos das administrações direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios seja destinada à divulgação na imprensa escrita comunitária. Neste projeto, porém, as associações defendem uma alteração para incluir as mídias comunitárias como beneficiárias da verba publicitárias – e não apenas os jornais.

“Sem recursos do Estado ou das prefeituras, as TVs comunitárias têm que fazer das tripas coração para sobreviver. É nesse sentido que nós apoiamos esses projetos. Já que não temos financiamento público é nossa última saída, pois os canais comunitários são onde as pessoas podem se ver, debater sua cultura, um lugar onde o telespectador não é tratado como consumidor e sim como cidadão. Além disso, quem faz publicidade na TV comunitária é o pequeno comércio local”, explica Fernando Trezza, presidente da Associação de Canais Comunitários do Estado de São Paulo (Acesp).

Para a deputada Luciana Santos (PCdoB/PE), o Congresso precisa garantir o financiamento dessa produção audiovisual. No último dia 13, a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática aprovou o relatório final da subcomissão especial que analisou, desde 2011, as formas de financiamento das chamadas mídias alternativas. O texto, de autoria da deputada Luciana, sugere a adoção de medidas administrativas para aumentar a participação desse tipo de mídia no contexto global das comunicações do País.

Entre as medidas aprovadas está a indicação para que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio crie programas específicos de apoio a veículos de mídia alternativa, especialmente por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O relatório também sugere que o Ministério da Cultura crie linhas de fomento específicas para esse segmento de mídia e que a Casa Civil destine mais recursos ao sistema público de comunicação, sobretudo à Empresa Brasil de Comunicação (EBC), com o objetivo de facilitar a democratização das comunicações no País.

“Estamos garantido isso em seis projetos de lei. Buscamos que elas tenham direito a fazer publicidade pública ou privada; buscamos a criação de um fundo para incentivar a mídia independente; e criamos a Lei Rouanet da comunicação que são descontos no imposto de renda para financiar as mídias independentes”, afirmou a parlamentar que hoje preside a Frente em Defesa da Cultura.

Jandira Feghali reforça a importância estratégica do fortalecimento dos canais comunitários.

Foto: Alexandra Martins/Agência Câmara

 

Para a presidente da Comissão de Cultura, deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ), esta é uma pauta é “irmã gêmea da diversidade” e entra no esforço que o colegiado tem feito para que o Congresso entenda a democratização da comunicação como uma pauta verdadeiramente estratégica para a democracia brasileira. Jandira avalia que o encontro gerou resultados positivos para quem trabalha com a mídia independente. "Hoje, além de se falar com muita força da radiodifusão comunitária, algumas propostas concretas foram apresentadas para que possamos sair do discurso, da retórica e ir para a vida prática, para financiar essa mídia independente que hoje precisa do nosso esforço e dedicação."